Artigo do Sapientíssimo irmão Barbosa Nunes.
A música sertaneja de raiz me emociona. São letras que lembram história do sertão. Saudades de um tempo em que a natureza era cantada em composições que diziam sobre águas cristalinas correndo entre verdes matas, florestas , campos e serras, simplicidade e histórias às vezes trágicas, mas brotadas do fundo de corações. Hoje a água está secando, florestas e matas devastadas, fauna e flora pouco conhecidas pela juventude de hoje. A violência é geral. Seres humanos sendo queimados em divulgação mundial.
Então para fugir desta carga negativa que todos estamos sofrendo, refugio-me e volto ao meu tempo, aos meus primeiros anos de vida ouvindo “Tristeza do Jeca”, “India”, “Menino da Porteira”, “Cabocla Teresa”, “Rio de Lágrimas”, “Chico Mineiro”, “Chalana”, “Moda da Pinga”, “Rancho Fundo”, “Saudades de Minha Terra”, “Viola Quebrada”, “Romaria”, “Rei do Gado”, “Terra Roxa”, “Flor do Cafezal”, ” A Enxada e a Caneta”, “Moreninha Linda”, “Beijinho Doce”, “Couro de Boi”, “Boi Soberano” e incontáveis outras páginas interpretadas pelos verdadeiros cancioneiros de nossa terra, Tonico e Tinoco, dupla que recebeu o título de “Coração do Brasil”.
João Salvador Perez, maçom, (Tonico) viveu de 1917 a 1994, morrendo aos 77 anos, após uma queda da escada do prédio onde morava. José Salvador Perez, (Tinoco), 1920 a 2012. Foi o artista sertanejo que permaneceu mais tempo em atividade, 82 anos. Morreu aos 91 anos.
O gosto pela música veio dos avós maternos. A primeira canção que aprenderam “Tristeza do Jeca”, composta em 1918, pelo dentista Angelino de Oliveira. Em eleição feita pela “Folha de São Paulo”, “Tristeza do Jeca”, foi classificada como a melhor música caipira de todos os tempos, também afirmada como hino da música sertaneja de raiz. Neste certame, com o mesmo número de votos “Menino da Porteira” e “Chico Mineiro”. A primeira apresentação aconteceu em 1935, na festa de Aparecida de São Manuel.
Moradores e empregados com seus pais na Fazenda Vargem Grande, os dois garotos já eram cantadores de modas de viola nas horas vagas ou nas folgas do trabalho na colônia. Em 1937 foram para a cidade de Sorocaba, trabalhando com as irmãs em fábrica de tecidos. Tonico, servente na pedreira Santa Helena, fábrica de cimento Votorantim. Tinoco virou engraxate na Estação Sorocabana.
Ao inicio da Segunda Guerra Mundial nada dava certo e eles decidiram retornar ao campo, o que, contudo, possibilitou aos irmãos Perez a primeira chance de cantar numa rádio, em São Manuel, Rádio Clube, ainda hoje em funcionamento. Trabalhavam durante a semana no campo e aos domingos cantavam na emissora da cidade. Mas a vida continuava difícil. A tentativa foi partir para a capital. As irmãs foram trabalhar em casa de família. Tinoco em um depósito de ferro velho. Tonico em chácaras no bairro de Santo Amaro.
Aos domingos a família ia ao circo no bairro do Cambuci e em um dos espetáculos conheceram Raul Torres e Florêncio, a dupla de violeiros mais famosa de São Paulo, que depois com Rielle na sanfona, formaram na Rádio Record, “Os Três Batutas do Sertão”. Na sequência foram calouros na Rádio Emissora de Piratininga. A seguir, no programa do Capitão Furtado interpretaram “Tudo tem no sertão”. Classificados para a final, cantaram de Raul Torres e Cornélio Pires, “Adeus Campina da Serra”.
O auditório aplaudiu de pé, com longos aplausos. No dia seguinte estavam contratados pela Rádio Difusora, do jornalista Assis Chateaubriand. Após três meses tiveram contrato renovado por dois anos, assim iniciando imediatamente o sucesso na capital, interior e pelo Brasil afora. Estrearam em disco em 1946. O sucesso chegou com “Chico Mineiro”, consagrando a dupla definitivamente e tornando-a a mais famosa do Brasil.
Sucesso absoluto, muita popularidade, mas com retorno financeiro reduzido, limitado aos circos. Quando se apresentavam recebiam percentual da bilheteria. Fizeram filmes, entre eles o baseado na vida e obra de “Tonico e Tinoco”. Em 1960, um golpe quase mortal. Tonico contraiu tuberculose, precisando ser internado em Campos do Jordão. O diagnóstico era não voltar a cantar, mas através da Rádio Nacional, Tinoco fez um pedido a Nossa Senhora Aparecida e aos ouvintes, para que seu irmão se recuperasse. Em devoção, construíram uma capela, oratório para a santa. Voltaram a cantar por muitos anos mais.
Entre suas milhares de apresentações, destaca-se no dia 6 de junho de 1979, o show de três horas no Teatro Municipal de São Paulo, com público recorde de 2. 500 pessoas. Os irmãos Perez, empregados rurais, chegaram a um dos mais famosos teatros do mundo, que até então só abria suas portas para óperas, balés e concertos eruditos. Em 1994 gravam o último trabalho, com participação especial de Chitãozinho e Xororó. A dupla passou por todas as mudanças na música sertaneja, mas jamais mudou o seu estilo. O último show foi na cidade mato-grossense de Juína, no dia 7 de agosto de 1994.
Tinoco, na saudade do irmão que faleceu, realizou dezenas de apresentações contratadas anteriormente à morte de Tonico. Em 2010, recebeu uma homenagem do cantor Roberto Carlos, no especial “Emoções Sertanejas”. Em 2012 tornou-se o artista sertanejo há mais tempo em atividade. Em 4 de maio de 2012 morreu aos 91 anos.
Concluo este artigo muito emocionado e fazendo da poesia “Coração do Brasil”, autoria de Joel Marques e Maracaí, minha homenagem à dupla Tonico e Tinoco.
“Somos os seus seguidores no braço desta viola, Serão sempre professores da nossa escola – Tantos outros companheiros ainda seguem seus caminhos, Dupla coração do Brasil, aceite o nosso carinho!
Pé na estrada desde cedo, dois amigos, dois irmãos, São mais de cinquenta anos de carreira e de canção – Com o nosso modo caipira em nome de cada caboclo, Esta é nossa homenagem a Tonico e Tinoco!
“Nesta viola Eu canto e gemo de verdade”!
Jeito simples de cantar agrada velho e menino, Seu exemplo sempre será nosso destino – Se hoje a moda sertaneja é ouvida mundo afora, Devemos a esses guerreiros grande parte dessa vitória!
Pé na estrada desde cedo, dois amigos, dois irmãos, São mais de cinquenta anos de carreira e de canção – Com o nosso modo caipira em nome de cada caboclo, Esta é nossa homenagem a Tonico e Tinoco!
“Nesta viola Eu canto e gemo de verdade”!
Suas vozes pioneiras brilham no “Luar do Sertão”, Vão passar de geração para geração – Amigos Tonico e Tinoco espelho da natureza, Recebam todo o carinho da juventude sertaneja!
“Nesta viola Eu canto e gemo de verdade, Cada toada, Representa uma saudade”!