Artigo do Conselheiro Federal Hélio Moreira para o Jornal Diário da Manhã de Goiás.
A cidade de Salzburg, localizada na Áustria, perto da fronteira com a Alemanha, incrustada entre as montanhas dos Alpes, é considerada uma das mais bonitas da Europa; o turista que a visita pela primeira vez não deixará de ficar extasiado com a arquitetura das suas casas, das suas ruas e, principalmente, sua aparência de tranquilidade.
Para todos os lados que nossos olhos se dirijam, veremos montanhas, quase sempre cobertas por neve no seu cume e as geleiras que, ao se liquidificarem, escorrem ladeira abaixo para formarem, aqui em baixo, na planície, o rio Salzach que cruza a cidade em toda sua extensão.
Não há como não se extasiar com a beleza dos seus múltiplos jardins, a visão romântica de muitas igrejas, quase todas seculares, com suas torres lembrando o estilo da época medieval, seus castelos, alguns suntuosos como o de Hohensalzburg, localizado em posição proeminente, assombreando, como fazia há muitos séculos, os habitantes da cidade.
Suas alamedas, algumas estreitas e floridas, levam-nos, com pouco esforço imaginativo, de volta a um passado de quase três séculos; misturamos com o gentio do século XVIII, ouvimos o burburinho de carruagens e o tropel de cavalos nas vias pavimentadas de pedra.
Se, nesta viagem, esperamos a chegada da noite, veremos os encarregados da iluminação daquela vila de dez mil habitantes, descerem em algazarra pelas ladeiras, empunhando tochas em suas mãos calejadas da labuta diária.
Neste ambiente bizarro e cheio de contrastes, onde o poder absolutista dos mandarins sobrepunha-se à vontade de qualquer habitante, onde a promoção social era praticamente impossível e aquele que, embora tivesse algum mérito pessoal, não pertencesse à casta dominante, só atingiria posições de destaque se transigisse nos seus princípios para agradar aos poderosos.
Neste local, onde a vista circunvoava o romantismo da natureza da região, no dia 27 de janeiro de 1756 nasceu Wolfgang Amadeus Mozart, uma estranha força que nasceu com a luz para resplandecer na escuridão dos costumes.
Seu pai, Leopold Mozart, foi um músico sem expressão, porém, percebeu que era o pai de um gênio e assumiu esta missão, desde os primeiros sinais do talento musical do filho, estando sempre ao seu lado, tanto na juventude como na vida adulta, passando a viver, daí em diante, praticamente, em função da sua formação.
Mozart viveu sua infância neste ambiente majestoso da natureza, em meio a jardins que emanavam a fragrância das flores trazida pelos ventos dos Alpes que corriam pela planície da Baviera.
Dedicava, praticamente, todo seu tempo em função da música; aos cinco anos de idade já compunha, aos seis, fez sua primeira excursão à Corte de Maximiliano III em Munique, onde se exibiu publicamente, aos sete, excursionou, durante mais de três anos, pela França e Inglaterra. (Mozart, K.Pahlen, Ed. Melhoramentos, 1991).
Por ser considerado gênio e precoce, Mozart era motivo de curiosidade cada vez mais aguçada nas cortes europeias, sendo, por isto, muito requisitado para viagens.
Em 1871, casou-se com Constance, que lhe deu seis filhos, sendo que apenas dois deles sobreviveram; a luta pela sobrevivência era muito difícil, pois, Mozart nunca conseguiu um cargo público que lhe desse tranquilidade financeira para trabalhar com a sua musica.
Na sua peregrinação na busca de uma oportunidade, teve que se humilhar, como registra a história, frente ao Arcebispo Hieronymus Coloredo, governante de Salzburg, que o expulsou da sua sala; somente em 1787, quatro anos antes da sua morte, ele foi nomeado para o cargo de Real e Imperial Compositor da Corte, porém, com ordenado, até vexatório, para os padrões da época.
Mozart trabalhava até 14 horas por dia, compondo por encomenda, peças musicais, óperas, sinfonias, além de se apresentar em saraus e concertos.
Foi nesta época que ele se aproximou de um grupo de pessoas que não aceitava a hegemonia do poder absolutista, discutiam e pregavam a vitória do espírito e do intelecto; estes homens, que vieram desempenhar uma grande influência na sua vida, eram livres e de bons costumes.
É de se ressaltar que pertenciam a esta classe de homens, algumas das grandes expressões da intelectualidade da época, como Goethe, Schiller, Herder e Fichte.
Eram os maçons! (Mozart, Alfred Einstein, Ed. Granada, 1971)
No final do ano de 1784, Mozart foi admitido na Ordem Maçônica em uma loja, de nome Benevolência, da cidade de Viena; a partir daí, pode-se verificar grande influência
do simbolismo da Ordem na sua obra.
A primeira composição que ele fez para uma ocasião maçônica foi a cantata “Fesellenreise – K. 468”, dedicada ao seu pai, também maçom; muitas outras seguiram-se a esta, como “Die Maurer Freuse – K. 471”, “Música para funeral maçônico – K. 477”, “Canção para abertura e fechamento da Loja – K. 483 e K. 484”, “Alma da criação – K. 429”, etc.
No entanto, os iniciados na Ordem consideram como uma das suas mais belas produções maçônicas a Ópera “A Flauta Mágica”, levando Goethe, após assisti-la, escrever “A maioria dos espectadores irão gostar, os iniciados na Ordem maçônica, como eu, irão entender o simbolismo que encerra esta peça” (The Magic Flute, E. Batley, Ed. Dennis Dobson, 1969).
Nove semanas após a estreia desta ópera, no dia 5 de dezembro de 1791, Mozart morreu, quase que na miséria (O último ano de Mozart, Robbins Landon, Ed. Nova Fronteira, 1990).